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quarta-feira, 15 de abril de 2015

O mal uso do ceticismo.

"Como já notaram alguns historiadores da Filosofia, na Grécia Antiga, o argumento dos céticos – uma escola filosófica que afirmava que é impossível obter qualquer tipo de conhecimento seguro – era usado como advertência para que as pessoas não se fiassem demais em seus conceitos e preconcepções. Hoje em dia, ao menos desde o início da chamada onda New Age, o mesmo argumento é usado como desculpa para se agarrar firmemente a qualquer tipo de conceito ou preconcepção: é impossível saber se estou certo vira "é impossível saber que estou errado", uma espécie de salvo-conduto intelectual para que se abrace qualquer ideia, e uma interdição contra qualquer tipo de crítica racional."
Carlos Orsi , em Pura picaretagem

É possível que sob a alegação de ceticismo alguns achem justificativa para duvidar de conhecimentos cujas evidencias se foram demonstradas. Ter sempre uma "margem de dúvida" em relação ao conhecimento é muito salutar, mas penso que devemos duvidar do que não tem evidencia, e à medida que as evidencias sejam apresentadas, a margem de dúvida deve diminuir, ou em outras palavras: Deve-se duvidar mais do que tem menos evidência e vive versa. 

Evidências podem e devem ser verificadas sempre que necessário. Mas qual a atitude mais comum? As pessoas muitas vezes acreditam em alegações ouvidas "por aí", recebidas por correio eletrônico, ditas por algum conhecido e mesmo na imprensa, mas sem que qualquer comprovação seja apresentada. 

Mesmo num âmbito mais acadêmico é comum que evidencias sejam "deixadas de lado" e suposições úteis tomem seu lugar. Pouco valem comprovações arqueológicas por exemplo sobre a história real dos hebreus se as lendas bíblicas são ainda ensinadas nas escolas. Contos fantasiosos são tidos nas aulas de crianças e adultos como sendo verdadeiros. "Os hebreus fizeram uma aliança com Deus que os libertou da escravidão no Egito", escrevem os autores dos livros didáticos, sendo que a documentação arqueológica mostra que não houve escravidão no Egito de hebreus monoteístas, pois na época relatada não havia a prática  da escravidão no Egito e os antepassados dos hebreus ainda eram politeístas. 

Praticantes da  "medicina alternativa" igualam o conhecimento médico científico ao seu sem base real de comprovação para com isso terem aceitação de seus métodos pouco eficazes (e em alguns casos totalmente absurdos). 

Em política  seja à direita ou a esquerda versões sem fundamento, ou que vão contra evidencias se impõem. Negação da existência de uma ditadura no governo militar a partir de 1964 e a suposta inexistência de escravidão no famoso Quilombo dos Palmares se tornam dogmas para diferentes espectros ideológicos, e são apenas dois exemplos. Há muito mais em diversas outras áreas.

Mais sofisticado que esse "senso comum" que se propaga quase espontaneamente sobre aceitar informações sem comprovação é a pratica de duvidar do que tem evidencias. Serve para esconder a realidade de forma deliberada e quase sempre mal intencionada. Há um interesse para que a realidade seja negada. 

Falando claramente, quando alguns líderes religiosos alegam que não há evidencias sobre a teoria da evolução, talvez não estejam só enganados, mas tb enganando intencionalmente seus fiéis para com isso esconder que vários dogmas religiosos já foram desmentidos. 

Místicos igualam suas suposições e delírios a conhecimentos do campo da física com uma facilidade impressionante a ponto de terem  identificado a mecânica quântica ao misticismo para o senso comum! "É tudo questão de crença, de fé", já ouvi um professor de ciências falando sobre teoria científicas. Não por coincidência é um professor extremamente religioso, que confunde suas suposições com conhecimento.

É comum a crítica religiosa que afirma ser a ciência tb dependente da fé. "Não existe verificação de toda evidencia nas ciências, logo ela tb se baseia na fé", dizem. O fato é que na ciência não há crença no que não é comprovado ou comprovável. De fato não há crença cega nem no que é comprovado, pois ciência se faz exatamente "duvidando do afirmado", sendo que como já dito, duvidando-se menos do que tem comprovações mais fortes, mas jamais acreditando em algo cegamente, sem uma margem de dúvida. 

Já na religião e no misticismo o comum é que a crença se de baseando-se em suposições e delírios, sem negar que sejam falsificações. Isso é fé, é crença cega em qualquer coisa que faça parte da tradição, dos costumes, sem necessidade de comprovação, ou com comprovações falhas ou falsas.

Pessoas interessadas na negação da realidade ora apelam para a crença no que não existe, ora apelam para a dúvida cega do que tem grande possibilidade de existir, utilizando nesse ultimo caso uma forma torpe de ceticismo, a sua má utilização. Em todo caso ou são enganadas ou enganam aos demais.