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segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Do antropomorfismo à teleologia e ao "universo simulado"

1-Antropomorfismo

Antropomorfismo é a atribuição de características humanas a toda a natureza, aos animais, aos fenômenos climáticos, ao movimento aparente dos astros no céu... É o imaginar que a realidade se dá à nossa imagem e semelhança, que ela é capaz de agir e provocar fenômenos de forma intencional, planejada, com objetivos... É algo comum na crença de povos do passado.

O raio e o trovão para nossos antepassados seriam uma expressão de fúria da tempestade, boas colheitas evidenciariam que a terra se mostra satisfeita com os humanos que a cultivam. O sol surgiria no horizonte pelas manhãs pq seria de sua vontade, e talvez algum dia se recusasse a voltar se não fosse presenteado com sacrifício de jovens capturadas de tribos inimigas a cada solstício de inverno. 

O grande urso, os lobos da floresta ou o leão feroz, por vezes representados por totens na aldeia protegeriam os guerreiros nas batalhas e tb na caça, obviamente se ficassem livres de suas lanças e flechas... 


1.1-Animismo e fetichismo:

Como subtipos do antropomorfismo nós temos o “animismo e o fetichismo” respectivamente a crença de que os “objetos inanimados podem ter alguma ação intencional” benigna ou maligna sobre indivíduos e a “atribuição de características humanas e mágicas a animais”... A proteção do clã ou tribo pelo espírito de um animal, ou o uso de amuletos além dos exemplos já mencionados acima sobre tempestades, a terra, o mar, o sol, lobos, leões e ursos são ilustrativos para os dois subtipos. 

Em geral os povos que se consideram muito cultos, como os europeus na época do colonialismo, atribuem essa tendência ao pensamento antropomórfico a povos que eles mesmos consideram incultos, selvagens, atrasados (africanos, nativos americanos, asiáticos). Mas entre a parcela mais instruída dos “povos civilizados” o antropomorfismo não encontrou um término, apenas evoluiu para a forma mais refinada da teleologia... 


2-Teleologia

Do grego telos, fim, e logos, discurso. É a suposição de que existe uma finalidade ou propósito nos acontecimentos não humanos. Crença, elaborada por Aristóteles, de que a natureza tem um propósito.

"Se esse armário existe é pq alguém o construiu" me disse um professor há quase três décadas. Ele falava sobre a origem do universo e da vida e não realmente sobre móveis. Outro me disse o seguinte sobre nosso sistema planetário: 

- Se uma maquete exposta numa feira de ciências é algo planejado, imagine o sistema solar real... 

No livro O espírito do mal, de William Peter Blatty há a seguinte questão: “se um astronauta achar uma câmera fotográfica na lua seria mais lógico considerar que o objeto evoluiu dos minerais presentes no solo ou que foi construído e trazido da Terra de alguma forma”? 

Se coisas simples como o armário, a maquete e mesmo a câmera tem que ser planejados para existirem, o que dizer de coisas muito mais complexas, como a vida ou o universo? 

Tal é o pensamento teológico e não fique surpreso de pensar exatamente assim, é uma crença comum a toda a humanidade e vamos entender o pq no item 2.4. 


2.1-Teleologia e a origem do universo

Para a teleologia se o universo e tudo o que ele contém existem é pq alguém, os deuses ou Deus, o construiu, o planejou, lhe deu uma significação, um fim, um objetivo, um propósito, um sentido. Há uma causa primeira não criada, mas capaz de executar a ação criadora de forma intencional, o que claramente implica que essa causa tem consciência e inteligência, ou seja, é algo igual a um ser humano, mas com maior capacidade de tornar sua vontade em algo real. 

Seria um "designer inteligente", tal qual na afirmação de que "é falsa a evolução por seleção natural, pois a diversidade de espécies vivas só poderia existir de forma planejada e não por acaso". Vamos no item 2.5 que o acaso não é a única alternativa ao planejamento e que planejamento é algo recente na história do universo. O universo se virou bem sem ele por bilhões de anos.


2.2-A Teleologia é um equívoco 

A maneira como funciona nosso cérebro torna muito difícil a compreensão de que o planejamento e a intenção não são inerentes à toda a natureza e sim características humanas.  Elas evoluíram em nossa espécie, que tem apenas algumas centenas de milhares de anos. O universo tem bilhões de anos. É erro crasso atribuir o princípio a algo que é derivado, é inversão de causa e efeito. 

O fato é que a realidade não precisa de planejamento e finalidades para se desenvolver, se transformar ou evoluir. E mesmo suas regularidades não são necessariamente planejadas. A característica de realizarem-se os mesmos fenômenos quando as mesmas condições e os mesmos elementos de dão são algo inerente à realidade e não algo que precise de planejamento*.

A ação de forças impessoais como a gravitação, o electromagnetismo, a expansão do espaço desde o "big bang", a produção dos elementos (hélio, oxigênio, carbono, etc) dentro das estrelas a partir do hidrogênio, as forças fraca e forte no nível subatômico e inúmeras outras são fatos a negar a suposição do designer inteligente, e por último, se algo complexo como o universo não pode existir sem um planejador, como esse planejador, ainda mais complexo do que sua criação pode existir sem ter sido criado? O pensamento teleológico nega a si mesmo, ou como escreveu Sandro Abel em uma postagem no Facebook "a necessidade de gnomos é sua e não do jardim".

Na história da filosofia temos desde Aristóteles até em Hegel a evolução do pensamento teleológico. Sua negação só se deu de forma definitiva por Darwin, o formulador da teoria da evolução por seleção natural. Finalmente foi negada a crença, sedutora, mas sem fundamento, de que há algo com características humanas (os deuses, a ideia, os fins últimos, o plano) objetivando a realidade e lhe dando origem, significado, funções, objetivos, finalidades...


2.3-Teleologia e arrogância

Já ouviu a interrogativa filosófica "qual o sentido da vida?" Pois bem, não há um sentido inerente ou inato dado por um ser superior zeloso para que cumpramos seu plano em nosso beneficio e para sua glória. O sentido é o que uma dada cultura lhe dá dentro de algumas características gerais** do comportamento de nossa espécie, mas para a teleologia "há algo mais do que isso".

Nasceríamos com alguma função no universo, nossa espécie existe pq tem um objetivo a cumprir, um propósito, somos especiais, os favoritos dos deuses, filhos de Deus, criados a sua imagem e semelhança... E tudo isso, a realidade, o universo, a vida e nós em especial seriamos obra de um ser superior, que nada é além do que um ser humano superior, com características humanas abstratas como a capacidade de planejar e tidas como capazes de criar a realidade. 

Mas não há nada disso na natureza. Temos alguma função a cumprir sim na sociedade humana pq essa sociedade criou a função que nos é dada, e apenas isso. Uma planta não existe para que algum dia alguém descubra que ela serve de remédio para malaria e nem os cavalos foram criados pelos deuses para servirem de montaria... É arrogância achar que somos especiais frente a natureza e outros seres vivos

Nesse contexto é a evolução das espécies a pedra de toque da discussão. É o campo de batalha mais significativo para defensores da teleologia, pois se nem a evolução humana é algo planejado por esse ser humano superior (um deus) tudo está perdido. E sim, tudo está perdido para a teleologia, pois a evolução das espécies é um fato e a espécie humana é fruto dela assim como todas as outras. O mecanismo da evolução, a já citada seleção natural (e não "o acaso") já foi desvendado há mais de um século e meio e só encontrou mais e mais evidencias que o confirmem desde então, mas o pensamento teleológico segue firme negando os fatos. Pq? Pq ele está de acordo com "a forma de funcionamento" de nosso sistema nervoso central.


2.4-O pensamento teleológico é fruto da forma com que funciona nosso sistema nervoso central

Paradoxalmente para a evolução de nossa espécie foi mais vantajoso um "motor de crenças" como cérebro do que uma máquina de dúvidas. Os céticos e questionadores tiveram menos sucesso em sobreviver e procriar do que os que tendiam a aceitar melhor as regras do grupo em que viviam e com isso tiveram menos descendentes... 

Nossos antepassados foram em maioria os mais crédulos, herdamos essa característica comportamental por meio de seus genes  e por isso tendemos a acreditar em quase tudo que se adéqua as tradições e crenças anteriores que já tivermos e que sejam próprias do grupo social que fazemos parte, sem necessitar de comprovação. 

Óbvio que os céticos críticos apesar de em menor número tiveram tb um papel importante, foram eles os maiores responsáveis pelas inovações, descobertas, invenções etc. Aliás ainda o são. São essas pessoas as que fizeram evolução das sociedades em todos os tempos. 

Foram indivíduos céticos corajosos por exemplo que se aproximaram de incêndios na floresta ou lava expelida por vulcões e assim dominaram o uso do fogo. Possivelmente desobedeceram regras do grupo que diziam para não se aproximar devido ao risco. Hj a maioria dos cientistas e demais pesquisadores sérios pode ser considerada cética em relação a crenças comuns a sociedades em que habitam, o que demonstra que o ceticismo crítico é fator fundamental para a produção e o desenvolvimento do conhecimento.


2.5-Teleologia e empatia

Há ainda outra característica inata de nossa forma de pensar que se soma a credulidade para formar o raciocínio teleológico, a empatia.


Somos animais que vivem em bandos e para isso a evolução nos dotou de empatia, nós percebemos as reações dos outros indivíduos que convivem conosco, entendemos se estão alegres, tristes, furiosos, antecipamos suas intenções etc. E nem sempre conseguimos diferenciar reações humanas de ações da natureza nesse quesito. Essa empatia pode pregar peças e forçar raciocínios falsos como "vamos agradecer à grande montanha por jogar fogo pela boca e destruir a aldeia de nossos inimigos" como se um vulcão pudesse ser intencionalmente um aliado. 


2.6-Teleologia e crença em deuses

Acreditar que somos especiais, acima ou a parte da natureza é algo comum a todas as culturas em todas as sociedades em qualquer época histórica. Mesmo nossos antepassados coletores e caçadores, ao contrario do que imaginam os românticos pós-modernos, não se consideravam "integrantes" da natureza e sim seres no mínimo em contato com seres superiores à natureza, dotados de poderes e dons sobrenaturais. 

Sim, a crença em deuses se liga diretamente ao pensamento teleológico e por isso é própria de nossa espécie no sentido biológico mesmo, embora obviamente com enorme gama de variações devido às diferenças culturais em que se insere ao longo da história em diferentes sociedades... “Ateus militantes” que desconhecem esse fato afirmam que todo ser humano nasce ateu e com isso cometem um equivoco de achar que nascemos como “folhas em branco aonde a sociedade vai escrevendo o que somos”. 



2.7-Teleologia e tabula rasa

Já nascemos com todo o aparato mental voltado a crer mais do que duvidar. Também temos inúmeras inclinações e outras características comportamentais inatas. Não somos como uma folha em branco ou uma tabula rasa. O erro de achar o contrario é cometido por ampla maioria dos sociólogos, psicólogos e demais membros das ciências humanas pois negam a influencia da evolução biológica em nosso comportamento, como se nosso cérebro não fosse, como os demais órgãos, originado por esse mesmo processo. 

Há uma base genética em nosso comportamento, há pessoas mais agressivas, outras mais pacatas, há pessoas mais crédulas e outras mais céticas, umas mais tímidas outras mais extrovertidas. A sociedade molda o comportamento a partir dessa base, atenuando alguns traços e incentivando outros. 

O estimulo ao pensamento cético critico deveria ser uma constante. Nas condições primitivas em que viviam nossos antepassados ser critico em relação à sociedade era algo que colocava em risco a vida do individuo e a bem da verdade ainda há sociedades opressoras em que pessoas assim tb correm risco senão de vida ao menos de punições por desobediência ou subversão... 

Mas como já vimos são os céticos críticos que desenvolvem a sociedade, fazem-na evoluir, daí a importância de estimular o livre pensamento se contrapondo a tendência natural da maioria em ser crédula e conservadora. 


2.8-A seleção natural nega a teleologia

A seleção natural é a prova cabal de que há sim como existir complexidades sem planejamento. Uma câmera fotográfica, um móvel ou uma maquete são de fato coisas simples planejadas por seres humanos. A evolução da vida e a existência do universo são fenômenos mais complexos e nem por isso algo planejado por seres superiores. É o velho antropomorfismo com nova roupagem da teleologia que impede as pessoas de verem as coisas como realmente são. 

É impossível se criar ou destruir matéria e energia, há apenas transformação, o que indica que o que constitui o universo atual apenas se transforma desde sempre. Note que é estranho afirmar que a realidade material existe desde sempre, mas quase todas as pessoas dizem isso sobre seres sobrenaturais (em especial Deus) sem pestanejar. Ou seja, para nosso modo de pensar um ser sem comprovação de existência pode ser eterno, já a realidade não!

A origem da vida é outro ponto importante. Tendemos a exagerar a diferença entre seres vivos e “seres brutos”. O fato é que tudo o que os distingue é a organização material, ou em outras palavras: a diferença entre humanos, elefantes, pés de couve, pedras e estrelas é a diferente forma de organização da matéria e energia em cada um. Os elementos são os mesmos e não há nada mágico, sobrenatural ou espiritual que faça um animal se mover, um vegetal realizar fotossíntese  ou uma estrela brilhar... São todos fenômenos naturais em diferentes formatos. 

Especificamente sobre evolução biológica não é difícil demonstrar o erro da teleologia agora que temos entendimento sobre a seleção natural e sua base genética. 

Quando um organismo se reproduz, os seus filhos não são cópias exatas suas, principalmente se for uma reprodução sexuada. Um organismo que tenha uma característica diferente de seus pais é um mutante, pois sofreu uma mutação genética. Genes são as estruturas em que estão as informações sobre as características das células, mudanças neles alteram as características da célula e do organismo. A maioria das mutações apresenta características prejudiciais ao organismo. 

Uma mosca que nasça com asas curtas ou assimétricas terá dificuldade no voo ou nem voará, um macaco cuja visão não lhe permita distinguir entre o verde e o vermelho, o amarelo e o alaranjado não vai achar frutos maduros entre a vegetação. São todos casos em que a mutação representou uma desvantagem e seus portadores não irão ter sucesso em viver e se reproduzir mais que os outros, mas há mutações que fazem o contrario. 

Uma cobra com dentes longos vai se defender melhor, vai sobreviver mais tempo, vai ter mais filhotes e os genes para dentes longos vai se disseminar entre a população de cobras. Em algumas gerações a maioria das cobras será dentuça pois houve uma seleção natural das que tem vantagem. É o acumulo dessas mutações “filtradas pelo ambiente” o que chamamos de seleção natural e apenas aparenta ser algo planejado. 

Dentes pontiagudos em cobras, garras afiadas em tigres, asas em pássaros, morcegos e insetos e nosso cérebro são todas características desenvolvidas dessa maneira e não algo planejado por um ser sobrenatural. Para mais detalhes ver o texto "Respondendo sobre evolução de espécies" nesse mesmo blog.

3-Realidade simulada por computadores

E por fim chegamos à era da informática, onde não apenas fazemos representações concretas da realidade com nossas mãos e abstrações com nossas mentes, mas sim representações abstratas da realidade com máquinas, os computadores.

Chamamos essa representação de "realidade virtual". Com ela pela primeira vez conseguimos mostrar algo abstrato que antes só podíamos realizar em nossos cérebros para outras pessoas. É quase como pudéssemos projetar nossos pensamentos em uma tela. Em parte isso já podia ser feito pelo cinema e pela TV mas apenas indiretamente e por pessoas especializadas. 

A informática colocou recursos muito mais dinâmicos que esses nas mãos de inúmeras pessoas comuns e a realidade se tornou fluida, plástica, possível de ser moldada ao gosto de cada um, como poderia ser feito por um deus que porventura atuasse sobre nosso universo...

3.1-Teleologia e realidade virtual

E aí temos um elo com a teleologia, ou melhor, um desenvolvimento dela. Se podemos simular a realidade em um computador ou numa rede formada por vários deles, pq não seria nossa realidade, ou nosso universo ele mesmo uma simulação com algum propósito, objetivo ou finalidade?

Essa ideia não é de todo inédita e nem totalmente criada pelo mundo moderno informatizado. A originalidade pertence a povos orientais, em particular aos indianos, que em algumas de suas expressões místico-religiosas afirmam ser o mundo um sonho de um ou mais de seus deuses.

Talvez a obra cinematográfica mais famosa a abortar essa situação seja Matrix, de 1999, mas que o faz de forma grosseira, onde as mentes dos seres humanos são enganadas em uma simulação da realidade mas seus corpos existem concretamente em estado de animação suspensa ou algo do tipo...

Noções mais refinadas da ideia de que o universo é uma simulação afirmam que tudo que existe é simulado, até mesmo objetos físicos ou concretos são apenas simulações e não apenas nossa mente ou consciência. Essa noção pode ser encontrada na obra E Tem Outra Coisa, de Eoin Colfer, livro da série Guia do Mochileiro das Galáxias...

De toda forma essa ideia apenas desloca o principio para mais além no passado. Se vivemos em uma simulação sofisticadíssima, absurdamente além de nossa própria capacidade computacional atual, isso apenas indica que fomos criados por uma civilização muito mais antiga e adiantada que a nossa, que tem o domínio de tecnologias superiores as que dispomos atualmente. 


3.2- Seres que criam realidades virtuais não são deuses

Mesmo que a realidade virtual fosse indistinguível da realidade para seus habitantes, não deixaria de ser uma simulação. Seus criadores não seriam deuses, pelo menos não no sentido de serem “a origem da realidade” e sim seres que são eles mesmos derivados das leis universais da evolução e que criaram uma simulação da realidade. 


Eles tb teriam evoluído de outros seres vivos, tiveram sua capacidade cognitiva aumentada pela seleção natural até o momento que talvez tenham passado a fazer isso por conta própria, com o uso de chips implantados no cérebro por exemplo. 

Criaram-nos com algum propósito, uma experiência cientifica ou simples diversão? Como saber? 

Mas isso é apenas especulação é claro, ficção cientifica que se apropria dessa tendência inata em nossa espécie que é ver intenção e planejamento em tudo. 


4-É necessário superar a tendencia que temos a crer em ilusões 

É ela, a tendência citada acima que orienta a formulação desde o antropomorfismo primitivo até a moderna noção da simulação universal passando pela crença teológica como já vimos.  Em essência ela é apenas a diminuição da complexidade da realidade aos limites da nossa espécie, é o não aceitar o universo como ele é para explica-lo e sim tentar dar-lhe a nossa forma para que ele se torne mais compreensível com menor esforço. 

Defender que se trata de característica inata em nós no entanto não deve induzir ao conformismo. Podemos e devemos superar a credulidade e o conservadorismo com esforço intelectual do mesmo modo que uma pessoa sedentária pode com esforço e dedicação passar a praticar atividades físicas  e com isso ter uma vida mais saudável.  

*Talvez se possa afirmar que esse “determinismo” é negado pela mecânica quântica, mas isso não é correto. Os acontecimentos “probabilísticos” das partículas subatômicas não anulam as ações de causa e efeito no mundo macrocósmico. Vc não verá uma estrela transformando hidrogênio  diretamente em ferro ou urânio no lugar de hélio, pois a “probabilidade disso ocorrer” é para efeitos práticos, nula.  

**Como características gerais entendo a permanência de comportamentos que são inatos em nossa espécie, que não variam ao sabor de culturas diferentes, como exemplo a valorização da vida dos elementos considerados "próximos" (que fazem parte do grupo) mais do que os que não estão nessa situação.

sexta-feira, 29 de julho de 2016

A publicidade comercial

Abaixo discorro sobre manipulação das massas tendo em vista convence-las a adquirir produtos, consumir em demasia ou sem necessidade real, ou ludibria-las sobre características dos produtos, tal como apresentar como saudáveis ou como remédios produtos que não são. Mas antes devo acrescentar que não há "bala magica que nunca erra o alvo". A publicidade comercial só é realmente eficaz quando: 

1-atinge e seduz as partes profundas e inatas de nossa natureza de predadores e protetores dos grupos que fazemos parte e;

2-encontra uma população sem um senso critico desenvolvido, sem instrução cientifica e cética.


Algumas pessoas são verdadeiramente fãs do talento dos publicitários em produzir propagandas comerciais, elevando seu trabalho ao nível da arte. 

Seria arte nos convencer de que precisamos de algo? E que esse algo tem que ser da marca tal? Ou que se não tivermos algo não seremos “bem vistos”, amados, elegantes, saudáveis, bons filhos e filhas, bons maridos e esposas, bons pais e mães, não estaremos na moda, não saberemos como nos portar socialmente... 

Não seremos felizes, não nos divertiremos, não mataremos nossa sede e nem nossa fome, não seremos amados, não seremos aceitos. 

Seremos gordos demais, magros demais, mal vestidos, não saudáveis, não saberemos educar nossos filhos, nem como cuidar de nossos idosos. 

Não saberemos nem como pensar se não corrermos agora mesmo ao shopping e adquirirmos o tal do produto que pode ser qualquer coisa que venha numa embalagem vistosa exposta em uma vitrine bem ilumina cuja propaganda vimos na revista ou na TV, ou mesmo na web... 

É a arte de vincular cigarro a uma vida saudável até que as mortes por câncer ficaram evidentes demais fazendo que a sociedade se tornasse um pouco mais crítica quanto a esse abuso e reivindicasse mudanças na legislação que trata da publicidade. 

E as cervejas cuja propaganda invade nossas casas no verão? No inverno são os “antigripais”. Morte no trânsito e remédios ineficazes. 

Homens se deixam seduzir por apelos ao poder, com o carrão simbolo de status. Mulheres por produtos ligados a beleza e aos cuidados com a família. Ao contrario do que imaginam os pós modernos isso não é apenas um padrão imposto pela sociedade e sim uma tendencia própria de nossa espécie como são tantas outras que bem manipuladas nos convencem muito mais do que as que os apelos apenas ao que é aprendido. 

Propagandas abusivas, apelativas, fraudulentas, de má fé são relativamente restringias pelo Conselho Nacional de Auto-regulamentação Publicitária (Conar). 

Nos anos 90, com a abertura da economia, o Brasil foi inundado por produtos importados. Suas as propagandas ficaram famosas pelo formato apelativo e de mal gosto, abusando da boa fé do consumidor. "Facas Ginsu (que cortariam até cano de metal sem perder o fio) e meia-calça Vivarina” (que não rasgariam nem com um garfo sendo passado nelas) ainda hoje são lembradas jocosamente como produtos duvidosos com propaganda ridiculamente abusiva. 

Não faço aqui uma crítica restrita a esse tipo trágico de propaganda. A crítica é a própria essência da publicidade comercial. Não se trata de demonstração das qualidades do produto a ser vendido e sim de "convencimento de que aquele produto, e só aquele, satisfaz as necessidades de quem o consome", sendo que não raro isso é falso duplamente. Não há necessidade real do produto e nem apenas aquele é eficaz quanto ao que se propõe, ou ainda pior, não é eficaz.... Nesse sentido foi uma ótima iniciativa a regulamentação sobre os remédios genéricos. 

A população ciente de que são as substancias dos remédios e não sua marca comercial que tratam as doenças fica livre para optar pelo mais em conta. 

A publicidade é útil também para se analisar o teor ideológico do meio de comunicação em questão. Revistas e jornais de informação elitistas anunciam produtos sofisticados. As empresas que os produzem e pagam pela publicidade não tem interesse que informações que interfiram negativamente em seus negócios sejam veiculadas, ficando assim a informação limitada por interesses econômicos. Esse fenômeno atinge tb as redes de televisão e sites ligados a grandes grupos economicos é obvio. 

A rigor, toda a chamada “grande mídia” tem muito mais compromisso com os grandes grupos econômicos do que com a população em geral. Quando o MST invadiu uma fazenda grilada pela Cutrale no interior paulista em 2009, tivemos uma evidencia contundente disso. A grande empresa pode usufruir das terras invadidas livremente, já o movimento popular não... A mídia, em especial a revista Veja e a Rede Globo de Televisão agiram agressivamente em nome dos interesses não do povo obviamente e sim do poder econômico com informações tendenciosas. 

O publico alvo da publicidade é outro dado interessante. As crianças e adolescentes são facilmente levadas ao consumismo. Quanto mais consumista é uma sociedade, mais infantilizada, ou “adolescentizada” ela se apresenta. Aliás, a “adolescência” tal como a concebemos hoje foi inventada no século passado, exatamente na mais consumista sociedade já existente em toda a História, os EUA. Ser criança, jovem e depois adulto faz parte do desenvolvimento biológico, obviamente, mas o padrão moderno se impõe com essa infantilização tola do jovem e mesmo do adulto, é isso o que se tornou a adolescência nas sociedades consumistas. 

Observe a disposição dos produtos em um supermercado. O que é realmente necessário fica em lugares de pouco destaque, mas futilidades ficam bem a vista, na fila do caixa ao alcance dos olhos e das mãos de crianças, jovens e adultos infantilizados. No shopping, os corredores são mais escuros e as vitrinas bem iluminadas, lojas populares ficam próximas das entradas, ao centro ficam as mais elitistas. Roupas femininas são em numero muito maior e com mais destaque que as masculinas nas grandes lojas. Já aparelhos de som potentes são destaque para homens. A publicidade se soma a essas e muitas outras iniciativas para elevar o consumo pela sociedade. 

Ainda sobre o público alvo, publicações que apelam para o misticismo, estética e auto-ajuda, são em maioria destinadas ao publico feminino, com dicas fantasiosas de produtos “milagrosos” para emagrecer, tirar estrias, celulite, além de abusar do uso de fotos retocadas para criar corpos irreais que seriam resultado do uso de tais produtos... Já produtos ligados a virilidade e força se voltam ao masculino com enormes frascos com proteína e promessas de músculos hipertrofiados...

Amuletos, medalhinhas benzidas, imagens sagradas e outros objetos supostamente com ação cientifica, como as pulseiras power balance completam o verdadeiro abuso implícito que permeia a publicidade voltada para pessoas com pouco senso critico e ceticismo, prometendo paz, amor, juventude e beleza eternos nessa e na "outra vida".... 

Definitivamente pessoas céticas como público alvo não são o que desejam os publicitários.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Social irracionalismo pós moderno

Relativizar todo conhecimento como sendo simples "ponto de vista" sem objetividade é algo próprio dos irracionalistas pós modernos.

A realidade se submete aos conceitos, visões ou interpretações de uma sociedade, de um povo, de uma civilização, de uma vila, de uma tribo... Não há diferença entre o conhecimento que temos sobre o universo e os mitos que nossos antepassados e outros povos atuais tinham ou tem. É tudo uma "construção social". 

É ter como igualmente válido a noção de que a Lua e o Sol sejam luzeiros no céu pouco acima das árvores ou que sejam corpos celestes gigantescos situados a enorme distancia da Terra. É tb considerar igualmente válido crer que doenças sejam causadas por maus espíritos ou vírus e bactérias, ou que a própria Terra seja ou não plana dependendo da concepção que se tem acerca dela...

É tb julgar ofensivo pensar que há progresso de uma sociedade em relação a outra, como se não tivessem sido mesmo nossos antepassados que insatisfeitos com a vida que levavam que construíram os pilares da sociedade moderna e é o que faz todo membro de uma sociedade dada, pois querer evoluir, ter uma vida mais confortável e menos sofrida é algo natural.

É ainda mais ser profundamente incoerente ao se julgar "relativista em relação as culturas". Dizer que não há sentido em se comparar umas com as outras pois seriam todas experiencias humanas igualmente válidas, mas condenar exatamente a "sociedade ocidental" e desculpar todas as outras por cometerem atos injustos ou opressores. 

É notório que em relação as sociedades onde o machismo é realmente ainda uma ameaça concreta às mulheres como no Oriente médio exista a tendencia dos pós modernistas em julgar que é algo "próprio da cultura", que não podemos interferir senão estaremos sendo "opressores de outras sociedades", que "não temos vivencia" para questionar...

Condenam em sua própria sociedade algo que perdoam ou mesmo fazem vistas grossas ao ocorre nas demais. Pq uma mulher ser agredida é algo pior no Brasil do que em uma aldeia da Arábia eu me pergunto. "Pq é próprio da cultura daquele povo" é o que dizem de fato, apesar de dizerem de forma disfarçada, pois não conseguem conviver com a própria incongruência obtusa de forma explícita.

Tem eles, os irracionalistas sociais especial desprezo por ciência e tecnologia. Não as veem como fruto do progresso de incontáveis gerações de povos de todo o mundo na busca de conhecimento. Para eles "ciência é algo nascido num tenebroso dia no seculo XVIII na Europa e usada desde então com o único proposito de dominação eurocêntrica" contra todos os demais povos do mundo. 

Por isso dizem trocar medicina por praticas de curandeirismo indiano, chines, homeopatia, florais e tudo o mais que chamam de "medicina alternativa". Mas quando com alguma doença séria vc não os verá em uma aldeia indiana no interior do Rajastão e sim numa clinica moderna de medicina de verdade do mesmo modo que usam a web para se comunicar e não sinais de fumaça...

Há tb a corrupção de pensamentos justos tais como "não confundir a violência do opressor com a reação do oprimido". No irracionalismo pós moderno essa formulação se torna chave para desculpar tudo o que oprimidos (mesmo que não o sejam de fato) fazem, como se fossem crianças inocentes, incapazes de responder por erros  e principalmente  não pudessem eles mesmo em outros contextos se tornarem tb opressores. Judeus terem sido vitimas de um holocausto na Alemanha nos anos 40 e agora serem os opressores dos palestinos não é suficiente para que irracionalistas descartem essa formulação tola de que há anjos e demônios e sim seres humanos... 

Não raro pensam sobre brancos e brancas do mesmo modo que racistas pensam sobre negros e negras, em homens do modo como machistas pensam sobre mulheres, em héteros como homofóbicos pensam sobre gays. Simplesmente revertem o preconceito, não o combatem. 

Em ação politica, mais especificamente, irracionalismo é "a crença de que não há fatos sociais e realidade independente de ideologias e sim formulações sócio culturais ao sabor de quem pensa". O irracionalismo político é um apanhado de noções desencontradas sobre justiça social e formas sem sentido de se conquista-la. Por exemplo substitui arbitrariamente o conceito objetivo de luta de classes por subjetivos como de guerra de sexos, de etnia e orientação sexual...

No limite divide o povo em tantos "grupos oprimidos" sem ligação uns com os outros que não ha mais luta unitária e a classe dominante encontra-se sem oposição real, efetiva. E faz questão disso ao criar espaços em que tais membros desses grupos não podem ser questionados, pois teriam "vivência na opressão" e esse é um dom que permite conhecimento absoluto sobre tudo. Qualquer critica ou "não concordância" é vista como traição se vc for do mesmo grupo, ou "tentativa de silenciar o oprimido", se vc não for de qualquer outro grupo, mesmo que não seja de qualquer grupo opressor. 

O irracionalismo tb é pródigo em atacar apenas efeitos de injustiças sociais e não suas causas, como ao criar o "modo politicamente correto de agir" que inventa apelidos bonitinhos para disfarçar preconceitos. E tb cotas (em especial as raciais), que num primeiro momento podem ajudar membros de grupos oprimidos a conquistar uma vaga na faculdade, mas em pouco perde a máscara ao se mostrar mantenedoras e não questionadoras do sistema de injustiça sócio econômica. 

Cotas são imediatismo, algo que deveria ser dado emergencialmente aos realmente injustiçados e não a pessoas de alguma "etnia oprimida" mas que já se encontram economicamente favorecidas. E deveriam tb serem vistas como um paliativo e não uma solução válida a médio e longo prazo, pois atenua o ataque ao problema real da péssima escola publica oferecida a população mais carente, independente de sua etnia...

O irracionalismo politico é conservador e se transveste de progressista, é algo próprio de países sem a tradição de uma esquerda forte, como os EUA onde as reformas são feitas exatamente para se manter a estrutura básica da sociedade e não realizar qualquer evolução. Uma vez infiltrado nos movimentos sociais e de reivindicação o irracionalismo moderno os reduz a um amontoado de bobagens inúteis. 

Tb pode causar danos por derivação à esquerda partidária, que se vê obrigada a acompanhar suas bases onde por ventura o irracionalismo já tenha feito o estrago de que é capaz. Em ultima instancia pode atingir setores de um governo que se pretenda progressista. Isso ocorre em especial nas secretarias e ministério da educação, que passam a adotar práticas desencontradas para tentar sanar problemas, como as cotas já mencionadas. Ainda pior passam a contar com formulações anti cientificas sobre os conteúdos a serem ministrados em aulas para crianças e jovens. Assim o já citado erro de se igualar ciência a mito passa a ser matéria de aula nos cursos de historia, filosofia, sociologia. Isso além  de outros descalabros do tipo... Para se valorizar uma cultura ao invés de se dizer a realidade sobre ela se contam historias fantasiosas sobre como a vida nessas sociedades era ideal, perfeita, sem problemas. Isso é já feito em especial em relação a cultura indígena, sempre mostrada de forma profundamente idealizada. Em outros setores de um governo, como a saúde o irracionalismo vai favorecer praticas pseudo medicinais, como a já citada homeopatia, na cultura vai reduzir a arte a lixo, as vezes literalmente... 

Vinda dos EUA e usando a web como veiculo de propagação essa tendencia irracionalista está cada vez mais sendo aceita por aqui.  De fato parcelas feministas e do movimento negro além de outros estão se desfocando da realidade social brasileira e crendo viver nos EUA, adotando formas de luta que talvez façam sentido lá, mas com certeza não aqui. 

E isso quando realmente não descambam mesmo para suposições esdruxulas, tais como alegar que "todo homem branco hétero é estuprador, opressor e se beneficia de um suposto sistema de opressão feito exclusivamente para favorecer brancos contra negros e em especial contra mulheres negras... Nesse sentido até mesmo praticas racistas são justificadas, pois se um homem branco é pobre isso é visto como "incapacidade do branco" e não como resultado da exploração capitalista... 

A bem da verdade usam de relativismo apenas quando convém, pois não relativizam nada ao fazerem afirmações absolutistas como as acima...

As vezes é realmente difícil se estabelecer limites entre as reivindicações justas e as tolices de vários tipos e temos que considerar que erros acontecem por vários motivos. Mas aqui se trata de algo deliberado, identificável por quem tem bom senso como sendo algo absurdo, cuja prática atrapalha a luta séria dos progressistas. 

Irracionalismo ridiculariza a luta popular abrindo a guarda para que a direita lhe desfira duros golpes, o que acaba por inibir pessoas centradas e com bom senso  a ingressar em suas fileiras. Ao se assumir como irracional a esquerda joga pela janela toda a herança do iluminismo e do socialismo cientifico de Marx...

No passado autores como Lenin criticavam na esquerda uma "tendencia revisionista" de se substituir disfarçadamente os fins pela ação sem objetivos, sendo puramente reformista. Atualmente a revisão da  se dá de forma ainda mais preocupante, abrindo-se mão da objetividade e acreditando-se que medidas mágicas podem mudar a realidade... É o próprio contra senso para quem se pretende progressista.  

Darwinismo social?!

"Eu detestaria viver em um tipo de sociedade "thatcheriana" em que os mais fracos são derrotados, os mais fortes se dão bem, ficam mais ricos, se divertem mais. Isso seria um tipo de "paraíso social darwiniano" e minha idéia de inferno."
www.youtube.com/watch?v=vXMD15__5kg

Dawkins nos mostra que o darwinismo, essa fantástica teoria sobre a natureza, não pode ser usada para justificar a manutenção das injustiças sociais. No trecho abaixo, outro notório cientista, Carl Sagan, nos da apontamentos que permitem negar veementemente essa falsificação:

"Sim, a nova idéia darwiniana pode ser virada pelo avesso egrotescamente mal empregada; magnatas ladrões e vorazes podem explicarsuas práticas criminosas invocando o darwinismo social; os nazistas e outros racistas podem recorrer à “sobrevivência do mais forte” para justificar o
genocídio. Mas Darwin não criou John D. Rockefeller, nem Adolf Hitler. A ganância, a Revolução Industrial, o sistema de livre empresa e a corrupção do governo pelos endinheirados são adequados para explicar o capitalismo do século XIX. O etnocentrismo, a xenofobia, as hierarquias sociais, a longa história do anti-semitismo na Alemanha, o Tratado de Versalhes, as práticas de educação das crianças alemãs, a inflação e a Depressão parecem adequados para explicar a ascensão de Hitler ao poder. Muito provavelmente, esses acontecimentos ou outros semelhantes teriam ocorrido com ou sem Darwin. E o darwinismo moderno deixa bem claro que
características muito menos cruéis, algumas nem sempre admiradas pelos magnatas ladrões e pelos Führers – altruísmo, inteligência geral, compaixão –, podem ser a chave para a sobrevivência."
Carl Sagan, O mundo assombrado pelos demônios, cap A anti ciência.

O "darwinismo social" foi muito influente, e de certa forma ainda o é, em forma mais branda, em vários países. A Alemanha fornece apenas o exemplo mais grotesco, mas a democracia americana o iniciou:

"Muito tempo antes da barbárie nazista, no entanto, a sanha da eugenia varria um país que é conhecido como modelo democrático, os Estados Unidos da América. Cientistas e pessoas de "bem", amparadas por uma doutrina pseudocientífica, promoveram uma verdadeira "guerra contra os fracos". Mais de 60 mil americanos foram castrados pelo movimento. Disseminou-se a prática da eutanásia "preventiva". Os alvos? Claro: pobres, doentes, negros, imigrantes, homossexuais."
Site www.gtpos.org.br acessado em 2010 

O darwinismo social é apenas um exemplo de que a falsificação de teorias científicas, ou a sua aplicação em áreas não adequadas pode servir para fins totalmente contrários aos objetivos da ciência, que são o fim do obscurantismo, da ignorância, e da superstição.

sábado, 27 de fevereiro de 2016

6-Seleção natural e comportamento

Aqui inicio um ponto realmente polêmico.

Polemico não com religiosos propriamente ditos, pois a maioria deles não aceita a evolução desde o início, desde seus princípios ou sua base.
Mas há outro tipo de negador da evolução biológica. Os cientistas sociais, psicólogos e afins, em sua maioria.

Não de toda a evolução realmente, mas das implicações que ela tem em relação ao comportamento dos indivíduos de nossa espécie.

Não há oposição entre pessoas instruídas ao fato de que o comportamento sexual e mesmo outros é biologicamente determinado ou ao menos fortemente influenciado pela genética nos animais em geral, mas quase todos acreditam que isso não ocorre em nossa espécie. Em especial nos que se alinham a tendências progressistas, da esquerda política. A coisa nessa perspectiva se torna mágica ao se saltar dos outros animais para os seres humanos.

Segundo eles agimos somente como fomos ensinados a agir, ou "de acordo com a forma em que fomos socializados". Nossos gostos, preferências, modo de se interagir, de pensar, até nossa inclinação sexual... Tudo é aprendido, tudo é fruto unicamente da cultura da sociedade onde vivemos.

Inicialmente essa crença que podemos chamar de ambientalismo teve um papel útil pois fez oposição a outra noção desencontrada chamada inatismo, que diz que as pessoas já nascem com todas as tendências, o comportamento e capacidades pré determinadas.

O inatismo assim entendido é de origem religiosa, Deus fez as pessoas assim como são, e não podemos mudar. Mas já há conhecimento para superar essas duas formas parciais de entendimento do comportamento humano. É necessário superar essas imposições, sejam ambientalistas ou inatistas para podermos chegar a realidade do que somos.

Não é possível questionar a existência de uma enorme capacidade de aprendizagem em nossa espécie e que isso gera padrões marcantes mas superficiais de comportamento diferentes em sociedades diferentes, mas por outro lado não há sentido em se distinguir de forma absoluta as diferentes culturas humanas, como se não houvesse similaridade e permanência entre elas.

A própria capacidade de aprendizagem que consideramos ser o que nos torna especiais é por si só uma característica inata, herdade de nossos antepassados que a adquiriram por seleção natural. Os mais aptos a viver no novo ambiente de savana que substitui a floresta tropical africana eram os que tinha características desse tipo, um cérebro já mais capaz de aprender além de pés próprios para caminhar no solo...

Se o inatismo religioso é um erro, tb o é o ambientalismo que nos vê como discos rígidos de computador em branco onde a sociedade grava tudo o que somos. Temos sim inclinações, tendências, gostos e necessidades de vários tipos, mas com base em diferenças genéticas e não determinadas de forma divina...

Entre os comportamentos humanos o sexual é talvez o que tenha uma base biológica mais facilmente observável. Isso se deve a importância que a reprodução tem. Ela é mesmo o objetivo principal dos seres vivos, que só existem em última instancia devido a ela. 

Então temos toda uma tendência a nos comportar em relação ao sexo de forma a que nossa reprodução seja garantida, pq foi isso que fizeram nossos antepassados, foi isso que nos legaram com seus genes e é por isso que estamos aqui.

É por isso que independente da sociedade, da cultura ou da época histórica o comportamento heterossexual é majoritário. A atração de homens por características femininas e vice-versa não é uma imposição cultural, uma criação social, não é aprendida, é algo inato.

Claro que esse é um exemplo pequeno para algo tão profundo e complexo como o comportamento humano (e não implica que seja justificável coibir a homossexualidade) mas serve ao objetivo de ilustrar o fato de que não somos apenas "seres sociais" como em geral se formulam nos cursos das ciências sociais e demais humanidades.

Não somos apenas fruto do ambiente onde vivemos atualmente. Somos tb nosso passado evolutivo, impresso em nós pelos genes de nossos antepassados.

Não se pode descartar o passado, e é muito estranho que cientistas sociais, que dizem prezar tanto nossa história descartem tão facilmente uma parte da mesma por não gostarem dela por ser contraria a seu modo de pensar...

Preferem continuar com suas crenças ao invés de se porem realmente como cientistas, pesquisadores e superarem noções que já não condizem com conhecimento disponível.
O que nos diferencia de outros primatas é um enorme desenvolvimento do neocórtex, a parte mais moderna do cérebro. Mas as partes primitivas continuam a agir, influenciando e mesmo dirigindo nosso ser sem que nossa consciência (sediada no neocórtex) perceba.

Nosso comportamento tem a mesma "base genética primata" que chimpanzés e bonobos e as semelhanças são notórias a quem se dispõe realmente a observar sem preconceitos a dinâmica de suas sociedades.

Chimpanzés são agressivos, hierárquicos, os machos são dominantes e é sempre um macho alfa quem detêm o poder. Sempre conta com o apoio de alguns machos e a oposição de outros, o que leva a conflitos constantes de disputa pelo poder.

Bonobos são menos hierárquicos, a liderança é de uma fêmea alfa em períodos de paz e conflitos normalmente não levam a violência e sim a caricias sexuais para sua resolução.

Com seu código genético quase idêntico é obvio que seja o ambiente em que vivem o fator mais importante para se determinar as causas dessas diferenças de comportamento.

Nosso código genético por sua vez tb é quase idêntico aos de chimpanzés e bonobos. Isso está de acordo com constatação de que sociedades com ambiente mais justo tem indivíduos tb mais justos.

Sem se levar em conta essa parcela nada desprezível de nós mesmos, o "comportamento de base genética", não se vai entender o indivíduo e a sociedade humana, e não se vai realmente conseguir transformá-la em algo melhor, mais justo.

O que é paradoxal, pois exatamente os que querem fazer a sociedade evoluir, os que se situam no campo político progressista são tb os que se opõem a essa perspectiva realista de nossa natureza deixando o campo livre para que os conservadores reinem absolutos nesse meio.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

5-Seleção sexual

Quando dizemos "seleção natural" a primeira coisa que vem à mente da maior parte das pessoas que já tem algum conhecimento da teoria é a "luta pela sobrevivência". Algo bastante adequado pois precisamos, assim como outras formas de vida, conseguir alimento, água, espaço e fugir, se esconder ou se defender de quem quer nos matar... 

Imagine um carnívoro caçando uma ave que não voa, ou cujo voo seja do tipo "curto e rasteiro". Obviamente as aves que de alguma forma tiverem características que escondam-nas do predador irão sobreviver mais do que as que forem mais visíveis, certo? Então explique o caso do pavão! Aquele enorme leque de penas coloridas que  tem nas costas (não, não é a cauda dele). Por certo o torna visível a carnívoros, então pq não se extinguiram devorados por mangustos, tigres, leopardos  e outros predadores?

É que alem da sobrevivência ha tb a questão da reprodução.

Todo pavão com enfeites de penas nas costas é macho. Eles são uma atração para fêmeas, que não tem enfeite algum e tb tem plumagem menos coloridas, que as escondem dos predadores. Então a vantagem é sexual, podemos dizer que há uma "seleção sexual". Quanto mais vistoso o macho, mais atrativo será para as fêmeas, mais vai se reproduzir e assim haverá mais filhotes que terão enfeites quando crescerem (é isso o que determina a existência de aves coloridas e não a criação divina como já mencionado no primeiro texto). Mas não termina aí. 

O macho tem o enfeite apenas no período de acasalamento e não o ano inteiro, não se expondo sem necessidade aos predadores... Raciocinando de acordo com a seleção natural o que ocorreu foi que os machos que não perdiam completamente as penas coloridas foram mais caçados e não sobreviveram tanto e não se reproduziram, ficando os pavões que perdiam as penas vivos para se reproduzir. Tudo isso sem um planejador, sem alguém que intencionou tornar pavões aves lindas, pois a seleção natura e sexual é um fenômeno natural anterior a existência de planejamento ou intenção...

Outro exemplo de "seleção sexual", mas que não poe a vida do individuo em risco real é o crânio  espesso dos bodes... Bodes disputam as cabras com outros bodes dando marradas (cabeçadas). Os que tem crânios mais resistentes tendem a vencer a disputa, tem mais filhotes e isso gera maior descendência de crânios mais espessos e portanto mais resistentes. A seleção sexual explica até fenômenos tais como a existência de flores com formato e cheiro idêntico a vespas por exemplo. Vespas polinizam flores, sendo úteis para a reprodução das plantas.

Uma flor que tenha o cheiro e o formato de uma vespa fêmea em época de acasalamento vai atrair mais vespas machos e sera polinizada mais que outra que não tenha essa característica. É claro que uma mutação dessas não se da em apena uma geração. Mas entre milhares de mutações, a maioria neutra e outras prejudicais, uma que determine um aroma agradável para vespa vai lhe dar vantagem. O mesmo com o formato de suas pétalas. A medida que mais e mais mutações forem ocorrendo em diversas plantas as vespas vão procurar flores as que lhes sejam mais agradáveis, favorecendo que mais e mais delas se tornem semelhantes as próprias vespas.




quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

4-Confusão entre Darwin e Lamarck

No texto anterior vimos a diferença entre Lamarck e Darwin, mas como já mencionado as vezes a confusão entre ambos se instala em nossa fala. 

Vejamos o caso da resistência das bactérias aos antibióticos.

Mesmo nas sessões de noticias sobre ciência dos grandes jornais o que é escrito sobre o assunto pode ser resumido assim: 

"as bactérias 'estão se tornando' mais resistentes aos antibióticos." 

É sutil, mas essa é uma noção lamarckista. A rigor o que acontece é que algumas bactérias já nascem com mais resistência aos antibióticos, e são essas que não morrem sob a ação deles e portanto se reproduzem, gerando mais e mais bactérias resistentes... 

O fato é que bactérias trocam material genético na reprodução, o que aumenta a variedade genética entre os indivíduos. É por isso que há bactérias mais ou menos resistentes, o que determina isso é a variação genética de cada uma.

Nos pés de nossos antepassados evolutivos ocorria algo assim:

A deficiência "pés com dedos curtos" impedia uma vida normal do individuo vivendo em árvores, mas não era impedimento total para sua reprodução. Por isso os genes para essa característica estavam na população. 

Mas aí ha milhões de anos ocorreu uma diminuição das condições climáticas que mantinham uma imensa floresta tropical que existia na África. Grandes áreas foram substituídas pela atual savana, vegetação formada mais por gramíneas, com poucas árvores. 

Ora, "os primatas de pés com dedos compridos" não puderam passar a viver no chão com muita desenvoltura, eram alvo fácil para predadores e não conseguiam correr de forma eficaz atrás de algum pequeno animal para caçar...  Já com os que tinham pés com dedos curtos ocorreu o contrário... Corriam melhor tanto para caçar quanto para fugir de carnívoros. Na verdade depois de algum tempo nossos antepassados passaram é a competir com outros predadores pela caça. 

Por isso chimpanzés, gorilas, orangotangos e outros grandes primatas passaram a ter seu número cada vez mais reduzido, e outras espécies foram extintas... Por não conseguirem abandonar totalmente a vida em árvores. Já nossos antepassados com pés impróprios para vida em arvores se mostraram aptos para a vida no chão... 

Essa característica junto com inúmeras outras tb hereditárias (em especial as que originaram um cérebro mais complexo) determinaram a sobrevivência e a reprodução de indivíduos de forma nunca antes alcançada por outra espécie de mamífero.

Dentro do contexto da seleção natural somos um "sucesso evolutivo" devido a imensa prole de bilhões de seres de nossa espécie.

Viver e se reproduzir são fenômenos que caracterizam os seres vivos. São os genes se multiplicando, fazendo cópias de si mesmos e se espalhando por todos os lugares. A vida existe em inúmeras condições em nosso planeta, o que nos faz pensar que pode existir tb em outros astros... 

Mas é pura especulação. O fato é que reprodução e sobrevivência apesar de serem fenômenos unidos as vezes são contraditórios e precisam ser melhor explicados. Vejamos o pq no próximo texto. 

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

3-Darwin e os pés dos primatas

Veja agora um exemplo mais próximo a nós, nossos pés, onde procurarei ser mais especifico sobre transmissão genética de características:

Nossos antepassados evolutivos tinham pés semelhantes aos de chimpanzés modernos, próprios para a vida em árvores, com dedos compridos. Pés com dedos mais curtos e semelhantes aos nossos era nesse contexto uma deficiência física, e isso é fácil de constatar. Nosso mais ágil garoto se torna desajeitado frente a um chimpanzé quando ambos vão subir em uma árvore. Mas pq isso ocorria? Ou pq havia peixes e insetos cegos no exemplo anterior, das cavernas?

Por determinação genética.

Os genes envolvidos na formação dos "olhos que enxergam" ou dos "pés com dedos compridos" faziam seus portadores serem mais aptos a sobreviver e a se reproduzir. Até agora nada a mais do que já vimos, certo? Mas há um detalhe importantíssimo que  descreverei de forma simplificada.

Genes em animais e outros seres vivos que se reproduzem de forma sexuada são herdados do pai e da mãe e estão em pares em inúmeros casos.

Então teremos 2 genes que determinam características.

E o que ocorre então? Um gene é dominante. Considere que entre os nossos antepassados o gene para pés com dedos compridos era dominante. 

Então o individuo com um gene para pés com dedos compridos e outro para pés com dedos curtos teria pés com dedos compridos. 

O mesmo ocorreria se tivesse ambos os genes para dedos compridos.

Ele só teria dedos curtos nos pés se ambos os genes vindos de pai e mãe assim determinassem. 

O mesmo para genes que determinam a formação e o funcionamento dos olhos e qualquer outra característica.

A implicação disso é que um gene que determina uma "característica não útil" pode ser passado para descendentes sem se manifestar se for não dominante, pois ele fica inerte no ser vivos que o porta.

Animais com apenas um gene para cegueira irão enxergar devido ao gene dominante que determina olhos bem formados e funcionando... Um animal com apenas um gene para dedos curtos nos pés terá dedos compridos pelo mesmo motivo.

Quando nasce algum cego, ou seja, com ambos os genes para cegueira ele não tem sucesso em se reproduzir a não ser que se mudem as condições do ambiente. É por isso que em cavernas escuras a maioria dos animais são cegos, pq nelas a vantagem é não enxergar. 

Não ocorre transmissão de cegueira de pai para filho por falta de uso dos olhos e sim por herança de genes que determinam isso. Do mesmo modo que não foi a "falta de uso" dos dedos dos pés que os atrofiou. 

Esse é o erro de Lamarck. 

Já a teoria de Darwin  após a descoberta da genética  por Gregor Mendel e explicitada acima ganhou uma base inequívoca de acerto sobre a realidade. 

Importante agora.

Para que o animal com reprodução sexuada tenha a característica não dominante como os dedos curtos nos pés ou cegueira é necessário que ocorra então cruzamento entre primos ou entre sobrinhos e tios (ou entre irmãos ou pais e filhos, o que é incomum). 

Primos mesmo os muito distantes cronologicamente falando podem ambos carregar o gene recessivo (não dominante) pois ambos descendem do mesmo ancestral que teve a mutação original.

Nesse caso seu filho poderá ter ambos os genes recessivos. 

Assim ele terá a característica não dominante de cegueira, dedos curtos e qualquer outra. 

terça-feira, 23 de fevereiro de 2016

2- Lamarck e os olhos de peixe



Pessoas que se opõem a realidade, que preferem a tendência ilusória de crer em um planejador universal inventaram exatamente uma suposição mirabolante chamada de "design inteligente". É tida por desavisados como sendo uma "teoria concorrente" da evolução por seleção natural; mas não tem consistência, é apenas o mito religioso reformulado. A união da tendencia a "vemos trabalho planejado na origem de tudo" com a recusa a aceitar a nossa origem primata faz do design inteligente uma crença muito forte, mesmo sendo tola, sem base real alguma.

Mas antes de Darwin muitos obviamente perceberam a evolução. Alguns se propuseram a explica-la de forma honesta, embora não tenham alcançado um nível de entendimento tão grande quando o famoso pesquisador (na verdade o mecanismo da seleção natural foi percebido pouco depois de Darwin  por Wallace. Então ambos dividem o mérito, embora Darwin seja mais famoso).

O mais conhecido formulador de uma tentativa de explicar a evolução antes da Darwin é Lamarck. Em geral sua explicação sobre a evolução é apresentada nos livros de escola de forma anedótica, usando uma girafa como exemplo de como ele imaginava que o esforço do animal em espichar o pescoço para se alimentar da copa das arvores acabou passando a característica "pescoço comprido" para seus descendentes.

A formulação de Lamarck é mais complexa e interessante do que isso e em tempos em que não se conheciam a ação dos genes na transmissão de características hereditárias forneceu algumas explicações bem convincentes embora erradas sobre como se da a evolução. Até hoje se não tomarmos cuidado ao falarmos de evolução nossas noções expostas se tornam "lamarckianas" e não "darwinistas". E isso é bastante comum e vamos entender pq a seguir.

Em uma caverna profunda e portanto sem iluminação um fato curioso se dá. É grande o número de animais cegos entre os que vivem exclusivamente nesse ambiente, como insetos e peixes em algum lago que porventura exista nela. Ora, a "falta de uso dos olhos" imediatamente parece ser o motivo para a cegueira, certo? Os antepassados desses animais não precisavam de olhos e logo passaram essa falta de necessidade para os filhos, netos, bisnetos, etc até que a falta de uso por gerações acabou por atrofiar os olhos. Convincente a explicação, mas falha.

Na verdade a característica "cegueira" que era uma deficiência física em "ambiente com luz" se tornou uma vantagem  num ambiente sem luz.  

Animais que nasciam cegos no ambiente com luz não viviam tanto e nem se reproduziam muito em relação aos que enxergavam. Eram portanto muito raros. Em ambiente sem luz puderam   viver e se reproduzir mais que seus concorrentes. Em algumas gerações seu numero suplantou o dos que enxergam.

Notem que evito sempre aquela velha fala de "ser necessário milhões de anos para que se de a evolução"... Não é sempre necessário um tempo tao grande. E tb ainda não mencionei o papel dos genes, em parte para simplificar a coisa, em parte pq Darwin conseguiu formular a teoria sem conhecimento sobre genes, embora tenha intuído alguma coisa sobre o mecanismo de ação deles. Mas cabe a Mendel a noção mais acabada de como se da essa ação.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

Um planejador universal, os olhos de Lamark e os pés de Darwin

Série de textos sobre seleção natural, lamarkismo e ação dos genes na evolução biológica


1-Da inexistência de um planejador universal

Além da oposição sofrida por quem tem alguma crença religiosa contrária a evolução das espécies, a teoria de Darwin tb encontra outros percalços. Um deles se deve a que sua concepção sobre como se dão os fenômenos que geram a evolução contrariam o "modo cotidiano de pensar". Pensamos de forma "teleológica" (não se assuste, esse é o único termo "complicado" que usarei). Ou seja tendemos a ver na natureza ações típicas de seres humanos, tais como planejamento e intenção. E essas ações seriam realizados por seres que agem exatamente como seres humanos, com intenção e planejando, mas com poderes muito superiores para realizar o que pretendem. Nós os chamamos de deuses.

É por isso que vermos “engenhosidade” ou "ação divina" no sistema solar com sua regularidade em ter astros girando em torno do Sol, e nos admiramos em como o deus de nossas crenças é maravilhoso ao planejar a existência de pássaros e flores que nos alegram com suas cores...

Ao contrario dessa "redução da natureza à humanidade" (antropomorfização) o que acontece é que toda a enorme quantidade fenômenos naturais que ocorreram antes da existência de seres humanos não tiveram planejamento ou intenção alguma. A formação de uma estrela, algo comum e grandioso no universo se deve a junção de uma grande quantidade de hidrogênio sob a ação da força da gravidade. Não há um artesão, um planejador ou um construtor de estrelas. O sistema solar é tb organizado pela mesma força com matéria resultante de estrelas já mortas. Já os pássaros e flores são fruto de seleção natural e voltaremos ao assunto mais a frente.

Devido a agirmos de tal forma, com intenção e planejamento acreditamos que tb as coisas se passam assim em toda a natureza. Quando vemos um automóvel, uma casa, uma cidade reconhecemos planejamento e intenção na sua origem e estamos certos. Quando vemos a existência de nosso planeta ou de qualquer outro astro, da vida, da ação da força gravitacional tb reconhecemos planejamento e intenção em sua origem, mas estamos errados.

O fato é que pouca coisa se faz realmente de forma planejada, nós é que valorizamos demais essa forma de agir e, muito pior, não procuramos entender como as coisas realmente ocorrem. É mais fácil acreditar que Deus criou as estrelas do que estudar o processo real da formação delas... Nossas ações se limitam ao que fazemos no pequeno planeta que habitamos e mesmo nele apenas a sociedade humana é planejada. Todo a imensa quantidade de outros fatores, de terremotos a marés, da rotação e translação da Terra ao surgimento e evolução da vida são independentes de nossa vontade e de seres criados por nossa imaginação.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

Respondendo sobre evolução de espécies

"Se a espécie transmuta para adaptar-se, não podemos aceitar a frase; 'Espécie em extinção'. Correto?"

Podemos aceitar a frase "especie em extinção" pq não é a espécie como um todo que evolui e sim alguns de seus indivíduos, mas vamos com calma.

Algumas espécies se extinguem por motivos variados como fenômenos naturais ou ação humana sem deixar descendentes evoluídos, ou seja sem indivíduos com mutações suficientes para uma diferenciação entre especies. É algo extremamente comum. Exemplo em vias de se realizar é a extinção dos chimpanzés, que não tem nenhuma especie que descende deles. Nós mesmos tb não temos e se nos extinguirmos não deixaremos nenhum herdeiro.

Já espécies em que alguns membros originaram outras podem continuar a existir conjuntamente com seus descendentes por tempo indeterminado ou ser extinta exatamente pela concorrência com eles caso essa seja acirrada e ambas as especies ocupem o mesmo ambiente que não tenha como manter a existência de ambas. Mas isso é raro, em geral só surgem novas especies quando os indivíduos de uma se encontram isolados dos outros para que não haja mais cruzamento entre eles.

Exemplificando podemos considerar o surgimento por mutação genética de pássaros que tenham bicos "aptos a comer a cápsula que envolve as sementes de mamão" em uma especie que come normalmente apenas a polpa dos frutos. Como há muitas sementes não comidas no ambiente a mutação desses indivíduos pode ser benéfica a eles, pois representa menor concorrência por alimento. Seus portadores irão se alimentar melhor, serão mais saudáveis, terão mais filhotes que irão passar essas características para sua descendência

E ainda mais, ao defecar as sementes irão possibilitar o nascimentos de mais e mais mamoeiros por uma grande área. Em algumas gerações será grande o numero de pássaros com bicos para semente e continuará tb grande o numero de pássaros comedores de polpa. Nada planejado, mas tb nada "por acaso". É o ambiente que serve de "filtro" para quem vai continuar ou não.

Mutações genéticas são inúmeras e variadas. Para cada uma que seja benéfica em relação ao individuo no ambiente dado existem inúmeras maléficas e neutras... No exemplo dado a mutação "bico inexistente" seria a sentença de morte para seu portador assim que deixasse de ser alimentado por seus pais, o que explica o pq que pássaros que nascem sem bicos sejam raríssimos, pois não vivem tempo suficiente para se reproduzir. 

De toda forma ainda serão a mesma especie pq falamos de apenas uma característica (formato do bico). Mas caso continuem outras mutações em indivíduos de populações distantes entre si ou mesmo isoladas por um acidente geográfico (uma serra, cadeia de montanhas, ilha, um braço de rio ou mar...) serão muitas mutações independentes que irão ao fim de gerações formar uma ou mais especies diferentes da original, pois não irá haver mais cruzamentos possíveis entre as duas especies, ou caso aconteça, os filhotes nasçam estereis. É o caso do cruzamento entre espécimes próximas geneticamente, como leão e tigre, ou jumento e cavalo...

A argumentação de que a "especie se transformou em outra" não é adequada portanto. São alguns indivíduos de uma especie dada que originam uma nova, não são todos os indivíduos dela que se "transmutam". 

Mas sigamos em frente, falemos mais da seleção natural darwiniana de forma mais próximaConsidere o exemplo dos pássaros cujo alimento é a cápsula que envolve a semente do mamão. Uma mutação que faça o estomago de alguns pássaros comedores de semente ser muito ácido vai matar as sementes de mamão comidas, vai prejudicar ambas as especies indiretamente, pois menos pés irão  brotar após a semente ser defecada, ou seja, sem a polpa do mamão e sementes ambas as especies ficarão sem alimento... 
Já estômagos menos ácidos permitirão que mais sementes se tornem pés de mamão

Assim em regiões com pássaros com estômago ácido teremos menos pés de mamão.  
Em regiões sem pássaros com estômagos ácidos  ambas as especies vão se beneficiar pois haverá mais pés de mamão. Eis um exemplo de que seleção natural não é necessariamente uma disputa de vida e morte entre especies e pode gerar "companheirismo". De toda forma essa mutação estômago ácido tende a ser suprimida, pois com menos pés de mamão menos pássaros poderão se alimentar. 
não ser que estômagos ácidos permitam uma melhor digestão de algum outro alimento, insetos por exemplo. Aí se esses pássaros se isolarem dos demais nascerá mais uma nova especie, e então já temos três: 

-a especie pela qual iniciamos o relato, que come polpa de mamão;
-a que se originou dela e que come a capsula que envolve as sementes do mamão e
-uma variação dessa com estomago muito acido que mata as sementes do mamão ao come-las o que causou a diminuição do numero de pés de mamão na região o que forçou a busca por outro tipo de alimento

O estômago mais ácido permitiu a troca do alimento "sementes de mamão" por insetos que existem em regiões mais distantes, o que causou a migração desses pássaros para essas novas regiões, provocando o isolamento dos mesmos em relação a especie de que evoluíram, o que por fim levou ao surgimento dessa nova especie agora insetívora

Por fim é importante frisar que evolução biológica não se da por acaso, mas tb não é algo planejado por algum ser superior... Ela é sim mediada por um mecanismo claramente explicado atualmente, que existe de fato e não é apenas uma ideia como tantos desejam que seja. A seleção natural.

Mutações genéticas como já vimos causam mudanças no individuo que está sendo gerado. Essas mudanças em geral são ruins (ausência de penas, bicos, garras ou pelos, olhos com defeito, dentes mais frágeis, etc) e nesse caso esses indivíduos morrem sem se reproduzir ou se reproduzem pouco

Ou pode haver mutação favorável (capacidade de correr mais rápido, asas mais fortes, maior resistência a vírus e baterias, capacidade de consumir alimentos que não estejam sendo aproveitados por outras especies, como as sementes de mamão que não eram comidas...) e nesse caso esses indivíduos vão sobreviver e se reproduzir, passando adiante suas características que são benéficas no ambiente em que estão, ou que as beneficiem em outro ambiente para onde se mudarem. 

O que causa essa "seleção natural" de quem vai ou não sobreviver e se reproduzir não é um planejador, e sim o próprio ambiente em que vivem ou para onde se mudam os indivíduos mutantes. 

E e a vida segue, segue a bilhões de anos esse caminho, com um numero absurdo de especies existentes e um numero muito maior de outras extintas. Todas originadas por essa dinâmica fantástica que é a evolução por seleção natural, sem planejamento, sem intenção, seja ela feita por humanos ou por deuses.