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terça-feira, 2 de julho de 2013

Irracionalidade e auto preservação

“Não acreditava naquelas invencionices sobre o que pode acontecer se despertarmos um sonâmbulo. Diziam que a alma fugiria do corpo e que isso poderia resultar em loucura, ou até mesmo em morte súbita, mas Charity tinha bom senso suficiente para saber que quando se desperta um sonâmbulo ele logo acorda em seu estado normal. De qualquer modo, ela nunca chegara a despertar o filho durante as crises anteriores e não faria isso agora.O bom senso era uma coisa, mas o seu pavor irracional era outra e ela sentia-se dominada pelo medo, sem saber como explicar aquilo.”
Stephen King, Cujo.

Sentimentos de auto preservação, em especial o medo, são uma boa adaptação evolutiva, pois possibilitam maior sobrevivência, pois nos livram de perigos. Sentimos medo de coisas reais e irreais, pois não somos muito eficientes em distinguir entre ambas. 

A raiva e medo são muito primitivos. Existem há muito tempo na história evolutiva, em cérebros de animais bem menos sofisticados que o nosso. E em nós seres humanos eles são gerados da mesma forma que nesses outros animais, de forma irracional. Há uma discrepância entre essa parcela primitiva de nosso cérebro geradora de sentimentos, e a parcela recente, responsável pela consciência e funções superiores. Ninguém, por mais racional que se acredite “para pra refletir sobre algo” quando está realmente com medo ou raiva. A reação é instintiva, de fuga ou defesa. É que a evolução se da assim mesmo, seres vivos são como “colchas de retalho” aonde partes vão surgindo e sendo integradas à medida que são úteis a sobrevivência e a reprodução. 

Nesse sentido não é correto afirmar que razão e emoção formam um conjunto harmônico que forma nosso ser como afirmam algumas corretes de pensamento alheias a realidade. Não há harmonia alguma e sim conflito entre coisas diferentes que tem que trabalhar juntas na luta pela sobrevivência... E aí surgem problemas que em geral são mal compreendidos e resultam em noções tolas e atitudes ainda piores. 

O medo e a raiva podem ser manipulados por lideranças políticas e religiosas para anular o senso crítico das pessoas e convencê-las a agirem “em bando” de acordo com os interesses de quem as manipula. Isso ficou visível recentemente no governo de G. Bush nos EUA, usando o terrorismo para saquear o oriente médio... Mas há casos menos evidentes que passaremos a analisar. 

Imagine milhões de reais sendo desviados da saúde. Quantas pessoas irão sofrer e morrer vítimas da falta de profissionais, leitos hospitalares, medicamentos e procedimentos cirúrgicos? Centenas? Milhares? Qual a pena que a sociedade irá pedir para os responsáveis? Que não fiquem impunes, que sejam levados para a cadeia e pronto esqueçam a história... 

Agora imagine que adolescentes da periferia de um grande centro invadam a casa de um idoso, espanque-o e mate-o... Qual será a reação da sociedade? Possivelmente irá apoiar medidas tais como redução da maioridade penal e pena de morte. Pessoas em comentários particulares irão defender que a policia invada a favela e mate mesmo esses marginais... E isso sem nem saber se os tais adolescentes são mesmo moradores de favela... O que torna diferente o comportamento da sociedade frente a esses dois crimes são exatamente o medo e a raiva. Eles nos fazem dar uma ênfase enorme a um crime explicitamente violento, mas não nos alertam sobre outro cuja violência é velada, mas que atinge um numero enorme de pessoas... É irracional. 

Pessoas tendem a seguir facilmente os procedimentos de costume do grupo em que vivem... Nos casos descritos, os corruptos que deviam verbas são empresários e funcionários públicos que ocupam altos cargos, pessoas ricas, acima dos comuns mortais. Fazem parte da parcela dominante da sociedade... Seus atos não despertam a raiva no mesmo nível da que despertam jovens de periferia, por vários motivos, mas quase todos irracionais. 

Os preconceitos dão as cartas quando as pessoas estão assustadas e com raiva.

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